Por Liliana Silveira
Hoje, ao reencontrar uma amiga
que está vivenciando a maternidade, ao mesmo tempo em que eu, tive a urgência
de colocar aqui um pouco do que venho pensando há algum tempo. Conversávamos sobre
a convivência com os nossos bebês. O meu filhote mais novo está com nove meses
e a filhinha dela com um ano e três meses. Eu, bióloga, doula, assistente de
parteira urbana. Ela, a minha amiga, bióloga e nutricionista. Não somos
mulheres “leigas”, portanto, nas questões da vida, biologicamente falando. Eu,
mais especificamente, sou nutriz (mulher que está em período de amamentação do
filho) pela terceira vez.
Então, dentre outros aspectos da
maternidade, estávamos revelando uma para a outra as nossas observações quanto
às crenças que (talvez secretamente) cultivamos. A principal delas, a
quantidade de leite que produzimos. Distraidamente, em dado momento da conversa
concluíamos, um pouco saudosas, que nos dava muita segurança a grande
quantidade de leite que tínhamos nos primeiros meses dos nossos bebês. Por
outro lado, concluímos também que, aquela produção exagerada de leite, poderia
ser um transtorno, se acontecesse durante um período longo. Atualmente, com
bebês maiores, somos constantemente lembradas por pessoas próximas de que “não
temos mais tanto leite” e que, portanto, “talvez” os nossos filhos não
encontrem leite suficiente no seio... E que, talvez, seja realmente bom para
eles tomar um mingauzinho, ou outro alimento que contenha leite de vaca.
Desde que me tornei mãe, percebo
o quanto somos abaladas por questionamentos do mundo racional, como
“quantidade” e “qualidade”. Em termos de aleitamento, concluí há muito tempo
que devemos fazer exatamente o contrário: apenas deixar rolar... Filhotes
humanos são semelhantes a outros filhotes de mamíferos em alguns aspectos. O
que cabe aqui, das minhas observações com os meus filhos: bebês “sabem”
encontrar leite em seios que estão aparentemente vazios. Como assim? Basta
observar a tranquilidade que eles têm ao mamar. Simplesmente mamam. E a mãe que
estava se achando “meio vazia”, logo sente a movimentação do leite em direção à
boca do bebê. Tudo resultado da sabedoria da natureza. Se o objetivo é gerar a
vida e garantir a sua continuidade, por que faltaria leite para o filhote?
Tenho nas minhas experiências a
recordação de alguns momentos críticos para mães que amamentam. O primeiro
deles, ainda nos primeiros dias do bebê, quando produzimos apenas o colostro. O
colostro é um líquido transparente, riquíssimo em anticorpos (substâncias que
protegem o organismo de doenças), que sai em pequeníssimas quantidades do seio
materno. Segundo informação que obtive recentemente, a cada mamada o
recém-nascido recebe algo em torno de uma colher de chá do colostro. Daí, ele
precisar passar quase que todo o tempo literalmente grudado à mãe nos primeiros
quinze dias após o nascimento. Além de receber o colostro, o bebê PRECISA do
contato com o corpo da mãe, com os seus sons, movimentos e cheiros. Muito além
da necessidade de mamar muito, o bebê está se adaptando ao mundo exterior,
saído de ambiente escuro, quente e apertado, o útero materno. Lá dentro, era
embalado pelos movimentos da mãe e estava fisicamente delimitado (protegido)
pelo corpo materno. É preciso acolher o bebê. Dar para ele muito colo, carinho
e peito de mãe.
No período pós-parto, é preciso
que a mulher tenha um ambiente tranquilo a sua volta. Nada de relógios,
cronômetros e julgamentos. Ela precisa sim, estar bem para estar disponível
para o seu filhote (filhote mesmo, em termos animais, viscerais). Esse grude
entre mãe e filho é essencial nos primeiros meses. Depois vai folgando, aos
poucos, ao longo do primeiro ano de vida do bebê.
Quando uma mãe se sente insegura,
assustada, deprimida, preocupada e desamparada provavelmente terá alguma redução
na sua produção de leite. Quanto mais esses sentimentos se intensificam, geram
tensão, que bloqueia a liberação de hormônios (prolactina e ocitocina,
principalmente) importantíssimos para a produção e liberação do leite. Além
disso, neste momento tão intenso e delicado está acontecendo a formação do
vínculo entre a mãe e o seu bebê. Eles precisam verdadeiramente estar juntos.
Outro “probleminha” dos primeiros
dias do pós-parto, os bicos dos seios rachados (ou fissurados). Se acontecer,
geralmente é porque o bebê está abocanhando o bico do seio de forma
“incorreta”, afinal, ele também está aprendendo a mamar. Ajuda observar como
estão os lábios do bebê durante as mamadas. Eles devem ser completamente
visualizados, como as bordas de um sino em volta da aréola do seio. E toda a
aréola (a parte escura do seio), ou quase toda, deve estar dentro da boca do
bebê. As rachaduras doem muito, podem até sangrar. Aconteceu comigo nos
pós-partos anteriores. É preciso ter força de vontade e suportar a dor durante
as mamadas por uns cinco dias enquanto os seios cicatrizam. Não precisa parar
de amamentar, a não ser que seja, de fato, insuportável. O próprio leite atua na cicatrização. Após
cada mamada a mãe deve espalhar o leite sobre os mamilos e esperar secar, com o
sutiã aberto. Se for possível secar ao sol, melhor ainda. Durante o banho, e
apenas durante o banho, lavar somente com água. Funciona mesmo, melhor do que
qualquer pomada ou creme cicatrizante. Enquanto não cicatriza, é bom ter alguém
por perto, de quem apertar a mão e que possa lhe servir um copão bem cheio de
água. Amamentar dá muita sede, e beber água na hora da dor, além de satisfazer
a sede, distrai a atenção, dá sensação de alívio.
Depois de passados mais ou menos
quinze dias do nascimento, o leite materno está sendo produzido em abundância. Tanta
abundância que, pela minha primeira experiência (há doze anos), concluí que
poderia amamentar tranquilamente dois bebês. Neste período, os seios costumam
ficar muito cheios e endurecidos. A pele fica muito esticada (às vezes brilha)
e quente. O bebê pode não conseguir consumir todo esse leite (e geralmente não
consome). A mãe fica aflita, pois os seios podem ficar doloridos, e os bicos,
endurecidos. Daí, o bebê não conseguir abocanhar o seio para mamar. É chegado o
momento de ter atenção e cuidado redobrados. É bom esvaziar os seios após as
mamadas, pois o leite acumulado pode resultar em mamas endurecidas e doloridas
(ingurgitadas), ou em mastite, um processo inflamatório. O leite extraído pode
ser doado para uma maternidade, pois muitos bebês prematuros precisam de leite
enquanto suas mães ainda estão a caminho de uma produção maior, que dê conta de
nutri-los e fazê-los ganhar o peso necessário. A ordenha (é ordenha mesmo,
igualzinho às outras mamíferas) das mamas pode ser feita manualmente ou com
bombinhas específicas, manuais ou elétricas.
Quando bebê está maior, entre o
segundo e o quarto mês, mais ou menos (deve ser assim, “mais ou menos”,
“geralmente”... pois, não somos máquinas!), acontece um ajuste entre a produção
de leite e a demanda do bebê. A mãe percebe que os seios não ficam mais tão
pesados e endurecidos. Às vezes, o período coincide com algum acontecimento
estressante, ou que mudou a rotina do bebê. E ele passa um ou alguns dias irritado,
choroso. O primeiro pensamento é que o bebê está chorando porque o leite está
acabando. E a angústia, inevitavelmente, se instala. Reside aí o perigo de
ceder à tentação de oferecer algumas mamadeiras com leite artificial.
Infelizmente boa parte dos pediatras conhece muito pouco do manejo da
amamentação. Não sabem o que orientar e terminam sugerindo (ou receitando, o
que é bem pior) algumas mamadeiras de leite artificial, para complementar a
alimentação com leite materno. O problema é que o leite artificial é difícil de
digerir, e o bebê que antes mamava em intervalos de uma ou duas horas, passa
cerca de quatro horas sem sentir fome. Para algumas pessoas próximas pode ser
até interessante perceber o bebê tão “tranquilo” ou dormindo por tanto tempo. Mas
o que acontece é que as horas adicionais sem mamar ajustam a produção da mãe
para menos leite. Desse modo, serão necessárias cada vez mais mamadeiras de
leite artificial. Gradativamente (mas não muito devagar), o corpo materno se
ajusta a produzir cada vez menos leite, pois, não está sendo solicitado através
da sucção do bebê no peito. Resumindo, o corpo da mãe entende que o bebê está
mamando menos e, portanto, deve produzir menos leite. Simples assim.
As mamadeiras são bonitinhas,
coloridas, direcionadas para meninos ou meninas. O leite artificial ilude pela
sua brancura e quantidade, pois pode ser preparado na quantidade desejada.
Ilusão mesmo. Diante do leite materno, perde. E muito. Além de todo o valor
nutricional e imunológico do leite materno, é bom lembrar que ele é específico
para cada bebê, existe a importância da relação entre o bebê e o seio da sua
mãe. O valor maior está naquelas horas intermináveis de aconchego, carinhos e
conversinhas amorosas de amamentação.
É preciso acreditar que é possível,
pois, ao contrário do que mostram as propagandas, amamentar não é fácil. Tem que querer e ter fé. Buscar
ajuda e ouvir com o coração aberto, pois ele é capaz de perceber conselhos
equivocados. É importante lembrar-se sempre que, independente do problema que
te aflige, tem alguém que pode te ajudar. Mulheres que já amamentaram ou que
estão amamentando e que gostam de amamentar são as melhores conselheiras. É que
costumamos guardar registros dos momentos preciosos de nossas vidas, e a mulher
que tem prazer em amamentar, a cada filho que tem, guarda as experiências como
um aprendizado. Tem prazer em compartilhar o que sabe com as que estão
precisando de uma ajuda. Amamentar um bebê é algo complexo, mas, ao mesmo
tempo, também é simples como as coisas da natureza. As respostas nem sempre
estão prontas, é preciso olhar a situação, refletir sobre ela, buscar
informações nas trocas de experiências com outras mães. E seguir amamentando, sem desistir!
Amamentar ou aleitar um bebê é
uma prática da Vida, que insere a mulher no mundo natural. Desperta ou
fortalece o feminino (talvez) adormecido. A partir daí, ao olhar para outras
mulheres, é possível perceber que compartilhamos dos segredos de um universo
particular e sagrado.
Um grande abraço materno!
Gostei muito, Lili. Além de muito bem escrito, está bonito, sensível. Que bom que tenho uma irmã assim tão sábia e inteligente ao meu lado! É isso, porque me faz muito bem te ter por perto! Beijos!
ResponderExcluir... também gostei muito! É um momento tão mágico entre mãe e filho. E realmente "o quanto somos abaladas por questionamentos do mundo racional, como “quantidade” e “qualidade”. Ainda bem que a internet está aí para auxiliar as mães e tranquilizar quanto algumas dúvidas.
ResponderExcluirO blog está muito bom. Você mescla muito bem conhecimento adquirido e experiencia vivida!
Parabéns!
olá, estou buscando uma doula! explico: uma amiga minha teve mastite, parece q foi sério, ocasionou asbcesso mamario e ela teve q operar e tomou remedio para parar de produzir leite. o bb deal só tem 3 meses, e dia 1 de outubro ela voltará a trabalhar. enfim, ela precisaria conversar com algm, com uma especialista, q além de apoio moral mostrasse a ela q é possível amamentar e tals. seria possível uma doula conversar com ela? é em salvador! desde já agradeço mto. mamairato@gmail.com
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